Bienal de Arquitetura de Veneza responde à Covid com habitação inclusiva

 

Em conferência de imprensa ‘online’, de apresentação da bienal, que começa no dia 22, sob o tema “How we will live together” (“Como vamos viver juntos”, em tradução livre), o arquiteto libanês Hashim Sarkis destacou que o ponto de partida foi “como a pandemia mudou a arquitetura e como a arquitetura responderá”.

Nesse contexto, afirmou que os participantes estão todos de acordo, no sentido de pensar a bienal e os seus projetos individuais, não para responder à “necessidade de distanciamento social e de organização do espaço”, mas para responder às causas da pandemia, às alterações climáticas, às desigualdades sociais, à migração de massas, convergindo para a ideia da união, em vez de afastamento.

“A profunda polarização política que tem emergido nos últimos 5/10 anos na Europa e nos EUA, e no resto do mundo, e a necessidade de criar plataformas para a reconciliação: estas são as causas da pandemia, e a pandemia passará, mas a menos que abordemos estas causas, não poderemos seguir em frente. Esta é a posição dos participantes quando lhes fiz esta pergunta, de como vamos viver juntos”, afirmou.

As cinco escalas abordadas nesta exposição são a do corpo humano, do agregado familiar, das comunidades, territorial, e de um planeta “onde hoje, com a pandemia e as alterações climáticas, é forçoso pensar em mecanismos para resolver este problema global”.

Contudo, Sarkis destacou a existência de uma “fluidez” entre estas escalas, tornando-as interdependentes, no sentido em que, para repensar o planeta, é preciso repensar o corpo, para repensar o agregado familiar, há que repensar a comunidade, e por aí adiante.

Estas cinco escalas contêm “três temas transversais que revelam como a arquitetura é um imaginário coletivo e não individual”, desde logo a questão do “nivelamento”, porque é necessário “criar um ponto de partida igual para todos”.

Esta é uma perspetiva que parte do ponto de vista social, “criando uma horizontalidade na cidade e na paisagem”, possibilitando a congregação de “várias comunidades, removendo barreiras e criando espaço comum”.

“Sinto que a qualidade do espaço é algo que está a emergir nesta bienal, a necessidade de restaurar o bem comum. Criar espaço onde pessoas se possam encontrar em modo informal todos os dias, e esta ideia de estar sobre um plano horizontal é importante”, sublinhou o responsável.

Outro tema presente em muitos projetos é a construção de pontes, estabelecendo uma ligação entre o mar e a terra, entre bairros, a ponte como símbolo daquilo que “liga, mas ao mesmo tempo [nos] dá uma posição de onde podemos ver o mundo, e [nos] coloca entre coisas, possibilitando-nos de ter uma visão diferente do que quando estamos confinados a uma área”.

O terceiro tema é o enquadramento, nomeadamente as estruturas que fornecem um recinto preliminar para acolher as pessoas, arquitetonicamente “transparente e poroso, que permite entrar, mas manter o contacto e a comunicação com o exterior.

Sarkis destacou que encontra a “arte de delinear o imprevisível” em muitos projetos, que “fornecem espaços temporários para as pessoas estarem juntas, não lhes impondo como se devem comportar, mas permitindo-lhes possibilidades diversas de agregação”.

“É a arquitetura do futuro. A arquitetura deve mudar e uma arquitetura que antecipa é uma arquitetura que é resiliente e que acomoda para o futuro”, considerou o curador, sublinhando que o que procura “trazer à discussão é como este parâmetro espacial, este exercício espacial e esta fantasia espacial pode inspirar e mudar o futuro da nossa sociedade e possa indicar possibilidades diversas para podermos viver em conjunto.

No final da sua intervenção, Hashim Sarkis surpreendeu o presidente da Bienal de Veneza, Roberto Cicutto, entregou-lhe um papel e revelou: “Em agradecimento trago comigo um pequeno presente. Plantei 17 cedros para honrar a cidade e os cidadãos de Veneza e a Bienal de Veneza. É um lugar para Veneza entre os cedros do Líbano”.

A apresentação do evento internacional dedicado à arquitetura contemporânea foi feita numa conferência de imprensa transmitida ao vivo, com o presidente da bienal e o curador-geral.

A exposição abre portas a 22 de maio, com regras de segurança para conter a pandemia, e um “programa expandido” de exposições, publicações, encontros, espetáculos e transmissão da instalação dos pavilhões nacionais.

Portugal vai ser representado oficialmente na 17.ª Bienal de Arquitetura de Veneza através de um projeto criado pelo atelier depA, coletivo do Porto, cujo programa será composto por um ciclo de debates a realizar entre Veneza, Lisboa e Porto, já iniciado, e uma exposição subordinada ao tema “In Conflict”, a apresentar no Palácio Giustinian Lolin, em Veneza, e que foi hoje apresentada ‘online’, em Lisboa.

À pergunta do curador da bienal – “Como vamos viver juntos?” -, a representação portuguesa responde com o projeto “In Conflict”, do coletivo de arquitetos depA, do Porto, com uma exposição e vários debates sobre a relação entre a arquitetura portuguesa e as questões de habitação, desde a Revolução de Abril de 1974.

O espaço oficial de Portugal estará novamente no Palazzo Giustinian Lolin, que é a sede da Fundação Ugo e Olga Levi, ocupando dois pisos do edifício, um dos quais para os debates e o outro para a exposição, com sete núcleos dedicados a outros tantos processos e casos de arquitetura de habitação em Portugal.

Nesses sete núcleos serão revisitados, por exemplo, os projetos habitacionais das torres do bairro do Aleixo (Porto), o conjunto habitacional Cinco Dedos em Chelas (Lisboa), o plano de pormenor da Aldeia de Luz, no Alentejo, e a reconstrução de casas destruídas pelos incêndios de 2017 (Figueiró dos Vinhos, Pampilhosa da Serra e Pedrógão Grande).

“A principal motivação desta exposição é que vale a pena continuar a acreditar na Arquitetura enquanto disciplina transformadora de um mundo e de um país que é ainda imperfeito. Há muita coisa que está melhor, mas ainda há muita coisa a melhorar”, afirmou hoje Luís Sobral, um dos quatro curadores da participação portuguesa, na conferência de apresentação à imprensa.

O arquiteto recorda que hoje ainda existem “muitas ilhas” habitacionais com condições precárias e “sub-humanas”, dando os exemplos do bairro 6 de maio (Amadora) e das casas onde vivem os trabalhadores temporários, na maioria estrangeiros, em Odemira, no Alentejo.

Todos os processos arquitetónicos e os debates associados podem ser consultados na página oficial da representação portuguesa, em https://www.inconflict.pt/.

“In Conflict” tem curadoria de João Crisóstomo, Carlos Azevedo, Luís Sobral, sócios fundadores do atelier portuense arquitetos depA, e Miguel Santos, curador-adjunto do projeto.

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