Catarina Ferreira de Almeida e Joel Neto escrevem 2ª peça em confinamento

 

“A certa altura percebemos que esta peça de teatro era uma peça sem história, no sentido em que era sobre a história fora da peça, sobre tudo o que acontece antes de escrevermos seja o que for, antes de a nossa caneta se encostar à folha de papel e escrever a primeira frase”, adiantou a escritora, em declarações à Lusa.

“Eu nunca vi um helicóptero explodir” é o título da segunda peça de teatro de Catarina Ferreira de Almeida e Joel Neto, levada a cena novamente pela Narrativensaio, com encenação de Luísa Pinto e com António Durães e Filipa Guedes nos papéis principais.

A peça tem ante-estreia marcada para este sábado, Dia Mundial do Teatro, no Centro Cultural e de Congressos de Angra do Heroísmo, na ilha Terceira, de onde é natural Joel Neto e onde o texto foi escrito.

A primeira peça escrita a quatro mãos pelo casal partiu do livro ‘A Vida no Campo’, com o qual Joel Neto venceu o Grande Prémio de Literatura Biográfica da Associação Portuguesa de Escritores (APE), em 2019.

A parceria com a Narrativensaio correu bem e decidiram “aceitar o desafio” de escrever uma segunda peça, desta vez partindo precisamente da ideia do processo criativo da escrita de uma peça de teatro.

“Esta segunda peça oferece um outro leque de temas, de angústias e de ponderações, porque é uma peça sobre um casal que decide escrever uma peça de teatro em conjunto”, revelou Catarina Ferreira de Almeida.

O tema central é “a peça dentro da peça”, mas o texto acaba por se focar nas “angústias” e “impotências” de um processo criativo a dois e no dia a dia daquele casal.

“Dilui-se, no fundo, no dia a dia de uma casa no campo, onde trabalham em conjunto, com o ruído da pandemia ao fundo, dilui-se em todas as pequenas coisas na nossa vida doméstica, em todos os pequenos despiques, nos desentendimentos comuns a todos”, contou a escritora.

Na altura, ainda casados, os escritores abordaram também nesta peça o casamento e a “erosão que ao longo do tempo vai tornando as pessoas invisíveis”.

“Um casamento é o retrato da nossa luta todos os dias, dos nossos pequenos heroísmos e das nossas pequenas tragédias para manter vivo um sentimento, que é um sentimento impossível, se nós todos pensarmos nisto, que é o amor. É um sentimento muito fugaz e ao mesmo tempo nós queremos que seja muito duradouro”, salientou Catarina Ferreira de Almeida.

O título da peça é parte de uma citação de John Cassavetes, um realizador que os dois autores admiram e que defendia precisamente que devia fazer filmes sobre os problemas de todos os dias e não sobre as grandes tragédias e histórias de heroísmo que não tinha vivenciado.

A pandemia de covid-19 acabou por marcar também a escrita desta peça, ainda que o casal já vivesse noutro tipo de confinamento.

“Uma ilha já é, de certa forma, uma fatalidade geográfica que obriga os seus habitantes a um confinamento, a um certo alheamento do resto do mundo”, explicou a escritora, acrescentando que os dois já trabalhavam “fechados em casa”, num “duplo confinamento”.

Mesmo que nos Açores tenham sentido menos o impacto da covid-19, a pandemia veio forçá-los a isolarem-se mais na ilha.

“Quando deixámos de fazer viagens a Lisboa, isso trouxe o peso da vida igual todos os dias na ilha e de uma certa monotonia que se instala na vida das pessoas. É uma coisa que nos afetou como afetou outros casais por esse mundo fora”, frisou Catarina Ferreira de Almeida.

Nos Açores, há várias semanas que é permitido público em eventos culturais, com lotação limitada, consoante o nível de risco do concelho.

Depois da ante-estreia em Angra do Heroísmo, a peça segue para Vila Nova de Famalicão, onde tem estreia marcada para 22 de abril, na Casa das Artes.

Para Catarina Ferreira de Almeida, a cultura deve ser retomada “o mais depressa possível, porque é importantíssima para a sanidade de todos”.

“A religião é muito importante nas vidas de muitas pessoas, a cultura também devia ser. A cultura devia ser uma religião e tem de ser uma religião com muitos crentes e muitos praticantes”, sublinhou.

Jornalista e escritor, Joel Neto conta já com mais de uma dezena de títulos publicados, entre crónicas, contos e romances.

Catarina Ferreira de Almeida é tradutora e tem apenas um conto publicado, mas ganhou o gosto pela escrita e tem já projetos em mãos para 2022.

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