‘Bochechas’, editado pela Revolve, é o primeiro álbum que Chinaskee grava com banda, mas que também pode tocar ao vivo sozinho se assim o entender, e “era um bocado esse o objetivo”, contou em entrevista à Lusa.
Em cada álbum, Miguel Gomes, de 24 anos, tem um processo criativo diferente e o de ‘Bochechas’ foi o que gostou mais: “Eu estar a escrever as canções como eu as quero, em vez de estar logo a receber opiniões de banda”.
“Basicamente isto são só canções à guitarra, que depois são trabalhadas em estúdio e em sala de ensaios com o produtor e com a banda, para ficar um disco de banda em vez de ficar um disco a solo. Mas é um disco que, na minha opinião, funcionava também só à guitarra, guitarra e voz”, explicou.
No início do ano passado tinha escritas “montes de músicas”, mas à medida que o tempo foi passando percebeu que “algumas já não faziam tanto sentido”.
“O primeiro confinamento, de março do ano passado, ajudou-me muito a deitar fora o que eu não queria e a fazer algumas músicas [novas], e só depois é que levei o resultado final destas dez canções para o estúdio”, contou.
Aí, os temas foram trabalhados com “Filipe Sambado, que produziu, Primeira Dama, que ajudou nos arranjos, e com a banda, a fazer os arranjos também”.
No álbum anterior, ‘Malmequeres’, que editou em 2017 com Os Camponeses, Chinaskee explorou uma sonoridade mais psicadélica, “com teclados e guitarras com ‘reverbs'”. A dada altura, começou a fartar-se desse “som um bocado etéreo” e a “querer fazer umas coisas mais agressivas, mais ‘in your face'”.
Em ‘Bochechas’, que é “principalmente sobre crescer, mesmo que não fale tanto desse processo”, o som mais ‘barulhento’ expressa a “raiva” que o músico sentiu em algumas alturas da vida.
Os últimos dois anos foram “de grande mudança” para Chinaskee: iniciou uma relação nova, “com bases mais sérias do que as anteriores”, que o levou “a ser uma pessoa mais responsável”, e arranjou “um trabalho recorrente”, como técnico de som no clube B.Leza, em Lisboa.
O facto de “estar a crescer e estar confortável financeiramente e psicologicamente” deu-lhe “vontade e coragem de falar de umas coisas um bocado mais traumáticas da infância e não só”, das quais “nunca tinha tido coragem para falar com alguém ou apresentar em forma de canção”.
Cantar o que passou “é uma maneira de expressar esses sentimentos um bocado negativos”.
“E é um bocado terapêutico, porque quando escrevi as letras já estava num sítio muito mais confortável, então escrever sobre isso era uma coisa de deixar passar essas alturas más e estar a aceitar o que me tinha acontecido a vida toda. Sei que há pessoas a passar pior, mas esta é a minha experiência, achei que era fixe falar sobre ela”, partilhou.
Durante os dois últimos anos ouviu “muita coisa, mas principalmente três ou quatro bandas, todas muito barulhentas”.
Então, a inspiração para criar os 10 temas que compõem ‘Bochechas’ foi buscá-la sobretudo a Nirvana, Car Seat Headrest, provavelmente uma das suas bandas “preferidas” atualmente, e My Bloody Valentine.
Focar-se em ouvir o que queria que o inspirasse foi um processo que aprendeu com o músico Filipe Sambado.
“Desde o ‘Malmequeres’ [que Sambado produziu] que eu e o Filipe temos sido um bocado inseparáveis”, contou. Chinaskee produziu “Revezo”, o álbum mais recente de Filipe Sambado e acompanha-o ao vivo, enquanto baterista.
“Entre 2017 e 2020 aprendi muito com ele, como produtor, como músico. Enquanto está a fazer um disco, ele gosta de ouvir só as coisas que quer que o influenciem e não estar a ouvir música nova. Reparei que [antes de gravar ‘Revezo’] ele só estava a ouvir Rosalia, Fausto, José Mário Branco e o meu processo foi um bocado parecido”.
Com o país a enfrentar um novo confinamento e a possibilidade de apresentar ‘Bochechas’ ao vivo ser “neste momento um sonho longínquo”, Chinaskee desistiu de adiar a edição do álbum: “Achámos que mais vale alegrar durante uma semana as pessoas que vão ouvir este disco na Internet”.
Apesar de não estar “a ver isto a acabar muito cedo”, o músico tem “algumas esperanças que mesmo que não haja concertos haja ‘live sessions’ ou programas de rádio que possam vir a ajudar a satisfazer um bocado essa vontade de tocar com os amigos”.