Companhia Vórtice estreia ‘A Sagração da Primavera’ nas Caldas da Rainha

A produção, criada em residência artística no Centro Cultural e de Congressos (CCC) das Caldas da Rainha, “traz uma abordagem nova, tanto ao nível conceptual, em que a dança se redimensiona com o suporte de uma videografia bastante exuberante e presente do início ao fim do espetáculo, como ao nível da sua própria desmistificação da mensagem”, disseram à agência Lusa os coreógrafos Cláudia Martins e Rafael Carriço, da Vortice Dance Company.

Na obra que tem como tema central o sacrifício de uma jovem que dança até morrer, para aplacar os deuses da primavera, os coreógrafos desvendam “a sublimação da vida”, vincando que “esse sacrifício tem o propósito de alcançar prosperidade, abundância, no fundo, a vida no seu esplendor”.

“O peso, a tensão e toda a narrativa inerente ao sacrifício estão presentes através da coreografia, em contraponto com a videografia, que desenvolve a eminência [a prevalência, a inevitabilidade] da vida após a morte, a urgência da natureza em desabrochar”, acrescentam os criadores do espetáculo que terá a sua estreia nacional nas Caldas da Rainha.

A obra em que “a morte e a vida coexistem em dois planos” resulta num espetáculo que “emana a sensualidade e a sexualidade inerentes a qualquer narrativa de vida e de morte”, sublinham os diretores artísticos.

Para o processo criativo, a dupla de coreógrafos inspirou-se não só na obra de Stravinsky, mas em toda a história deste bailado, desde a sua estreia, em 29 de maio de 1913, no Théâtre des Champ Elysees, com coreografia de Vaslav Nijinsky e direção musical de Pierre Monteaux, com o escândalo que causou.

Se para os diretores artísticos da Vórtice “‘A Sagração da Primavera’ foi uma janela que se abriu para a modernidade”, para o maestro Nuno Côrte-Real, a quem cabe a direção musical desta criação, “há um antes e depois” desta obra que “marcou toda a história da música do século 20”.

“A Sagração da Primavera” revolucionou praticamente a música, em termos de ritmo, equilíbrio orquestral, timbre, forma, dimensão harmónica, com impacto sobre a melodia, e o modo como era concebida até então, estabelecendo um contexto de modernidade, que também se estendia à dança.

A artista francesa Valentine Gross, autora dos figurinos originais, deixou escrito um testemunho da estreia, em 1913: “O teatro [dos Campos Elísios] parecia sacudido por um terramoto. Parecia ruir. As pessoas gritavam insultos, pateavam e assobiavam. Havia bofetada e até mesmo quem desse murros. Impossível descrever toda aquela cena”.

“A Sagração da Primavera” teve, porém, e desde logo, o reconhecimento de personalidades como os compositores Maurice Ravel e Claude Debussy que também tinha conhecido desagrado do público mais conservador, com o seu poema sinfónico “Prélude à l’après-midi d’un faune” (“Prelúdio à sesta de um fauno”).

A obra musical de Stravinsky será interpretada ao vivo pela Orquestra do Atlântico, com Nuno Côrte-Real a dirigir os cerca de 55 músicos.

“A música é muito poderosa pelos seus aspetos rítmicos, muito intensos para que ouve e para quem toca e a que ninguém pode ficar indiferente”, disse o maestro à Lusa.

Na criação da Vórtice a música de Stravinsky estará “em sintonia com a parte coreagráfica e de vídeo”, dando corpo ao “desafio que é ‘A Sagração da Primavera’ ao vivo, um acontecimento que, acredito, as pessoas devem querer ver e ouvir”.

Uma possibilidade que se abre no próximo dia 29, no CCC Caldas da Rainha, onde a obra será estreada para depois ser apresentada a 05 de fevereiro, no Teatro-Cine de Torres Vedras e, a 23 do mesmo mês, no Coliseu de Lisboa.

A obra é uma coprodução do Centro Cultural e de Congressos das Caldas da Rainha, do Cine Teatro Torres Vedras e do Coliseu de Lisboa.

A Temporada Darcos (dirigida por Nuno Côrte-Real) e a Vortice Dance Company (cujo percurso artístico de mais de 20 anos é pautado por digressões internacionais, e pelo reconhecimento da crítica e dos públicos de mais de trinta países, em cinco continentes) são apoiadas pela Direção Geral das Artes.

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