Exposição no SAAL revê resposta do 25 de Abril à falta de habitação

A mostra, que ficará patente na Casa Das Artes até 25 de fevereiro, decorre no contexto do projeto ‘Uma Arqueologia da Utopia’, que tem por objetivo revisitar os 75 ‘bairros SAAL’ construídos por todo o país, na década de 1970, após o 25 de Abril, para resposta às carências de alojamento então verificadas.

A exposição “surgiu da intenção de perceber como estão os ‘bairros SAAL’, o que aconteceu com eles, e se se mantém a ideia que esteve na base dos projetos”, como disse à agência Lusa a investigadora Ana Catarina Costa, da Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto (FAUP), uma das organizadoras da mostra.

O programa SAAL foi iniciado em agosto de 1974, por iniciativa do então secretário de Estado da Habitação e Urbanismo, o arquiteto Nuno Portas, contou com arquitetos como Fernando Távora, Álvaro Siza, Alexandre Alves Costa, Artur Rosa, Gonçalo Byrne, Raul Hestnes Ferreira, e foi extinto em outubro de 1976.

O SAAL visava “uma via alternativa para a resolução das carências de alojamento das classes populares, através da transformação e melhoramento dos bairros degradados”, e atravessou o país, envolvendo “moradores, quadros técnicos e entidades locais e estatais” que procuraram, “num esforço intensivo e coletivo, dar voz, casa e cidade aos setores mais marginalizados da população”, como se lê no texto de apresentação da mostra.

Passados 50 anos, o objetivo é ver “qual foi o destino das 75 operações construídas no âmbito deste programa”.

Além de Ana Catarina Costa, o projeto envolve ainda João Paupério, também investigador da FAUP, e os antigos alunos da faculdade Francisco Ascensão e Maria Rebelo.

Em conjunto, querem, a partir de “uma perspetiva ancorada nos moradores dos bairros (…), reconhecer as camadas estratigráficas que compõem as formas de vida em comunidade e, a partir destas, evidenciar uma multiplicidade de conflitos, afinidades, contradições e solidariedades”.

“Um dos pontos altos da exposição é a [parte] relativa ao bairro da Maceda, na zona oriental da cidade do Porto”, disse Ana Catarina Costa à Lusa. Esta foi uma das primeiras ‘operações SAAL’, a avançar após o 25 de Abril.

No conjunto, a exposição testemunha “o trabalho das chamadas brigadas técnicas de arquitetos em interação com as associações de moradores que foram organizadas”, e “todo o processo de mobilização da comunidade”, assim como “boletins informativos e jornais de bairros”.

Inclui igualmente “registos fotográficos de bairros no estado atual e dez áudios de relatos de moradores que dão uma perspetiva do que foi e do que são aqueles lugares”.

Ana Catarina Costa sublinhou que “há bairros que ainda não estão terminados, onde ainda há questões legais por resolver, outros [que] já não funcionam como foi estipulado, ou seja, as casas já não são das associações de moradores, mas foram privatizadas, há várias situações”.

Com a exposição, será apresentada também a plataforma digital do projeto ‘An Archaeology of Utopia’ (‘Uma Arqueologia da Utopia’), “uma plataforma ainda em construção, aberta a contributos […] que quer fazer uma espécie de mapeamento dos bairros do SAAL”, explicou ainda Ana Catarina Costa à Lusa.

O projeto conta com apoio da Câmara Municipal do Porto, do Centro de Estudos de Arquitectura e Urbanismo, da Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto, da Fundação para a Ciência e Tecnologia e da Direção Regional de Cultura do Norte.

Em 2014, o SAAL foi alvo da exposição ‘Processo SAAL: Arquitectura e Participação 1974-1976’, no Museu de Serralves, que pôs em evidência documentação e operações do programa que, no total, visou mais de 40 mil famílias e envolveu centenas de arquitetos, engenheiros, estudantes, desenhadores e assistentes.

O diploma que estabeleceu o SAAL partia do reconhecimento de uma carência de 600 mil alojamentos, no final da ditadura, com um quarto da população a viver sem condições de habitabilidade, e mais de metade sem acesso a abastecimento de água nem saneamento, sem instalações sanitárias nem energia elétrica.

A inauguração da exposição ‘Se isto fosse um paraíso feito de nada’ está marcada para as 16:00 de sábado, na Casa das Artes, no Porto.

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