“O programa Fábrica de Cine foi criado em 2017, após várias experiências a que chamámos ‘pequenos cineastas’, um plano de férias com crianças de 7 a 12 anos de idade em comunidades de escassos recursos e vulneráveis da Venezuela”, contou a luso-venezuelana.
Maria Helena Freitas falava à agência Lusa à margem da conferência de imprensa sobre o lançamento da nova edição da Fábrica de Cine, que teve lugar na Casa do Livro, em Altamira, no leste de Caracas.
Explicou que cada seminário de formação dura um ano letivo e trata-se de “um programa muito exigente”.
“Não só para nós como produtores do projeto, mas também para os tutores e os estudantes” do qual já se beneficiaram “5.000 jovens” e foram produzidas “43 curtas-metragens”, relatou.
A nova edição tem já 200 alunos inscritos e vai decorrer aos sábados, desde a manhã até à tarde, na Universidade Católica Andrés Bello.
A luso-descendente precisou que é um programa gratuito, sem limite de idade para participar, que começou no Município de Baruta, estendendo-se depois a Chacao e agora abrange toda a área da Grande Caracas.
Um programa que conta com o financiamento de patrocinadores internacionais, de organizações não-governamentais (ONG) e da embaixada alemã em Caracas.
Questionada sobre quais os temas comuns nas curtas-metragens, Maria Helena Freitas explicou que “a questão da violência de género repete-se muito” e “é um indicador de que na Venezuela, seja em casa ou no trabalho, está muito presente e que preocupa”.
Maria Helena Freitas, que também é jornalista, explicou que “os jovens expõem as questões que os afetam, as comunidades os problemas que enfrentam e como os vão resolver, quer deixando evidências nos filmes, quer criando soluções que possam filmar e exibir”.
“Outro tema recorrente é as preocupações da juventude, para onde ir e como atingir os objetivos”, disse a luso-venezuelana, sublinhando que muitas vezes “os jovens têm muitas dificuldades na realização dos seus sonhos profissionais e não sabem como o fazer”.
Segundo Maria Helena Freitas “existe uma crise educacional” nas universidades locais, “que está a afetar a saúde e a estabilidade dos jovens” e que se transformou em um tema recorrente na Fábrica de Cine.
“Outro tema é o dos professores, que está tão na moda e que estamos atualmente a viver. Os professores que migram, que vão embora, a falta de professores para solucionar a carência académica”, disse, precisando que abordam ainda os problemas de água e transporte, entre outros.
“Temos visto trabalhos muito interessantes, nem tanto de denúncia, mas de soluções. As pessoas começam a aprender a resolver os problemas, a se unirem, a criar redes comunitárias e a Fábrica de Cine está a contribuir muito para melhorar a qualidade de vida através do cinema como instrumento de comunicação, formação, denúncia, e divulgação dos problemas, mas acima de tudo, para ajudar na solução”, afirmou.
Questionada sobre uma possível censura, explicou que tem havido uma conexão emocional com todos e que têm recebido ajuda tanto externa como interna das distintas organizações.
“Nós nos conectamos com ambos lados. Não somos uma organização política, não temos uma presença política no país e não pertencemos a nenhuma tendência política. Somos cultura, educação, formação, responsabilidade social e isso ajudou-nos a penetrar nas comunidades e nas organizações e a conseguir que ajudem os jovens a fazer o trabalho”, frisou.
Segundo esta luso-venezuelana, “os jovens vão denunciar sempre, vão ser desafiadores, revolucionários, críticos e, vão estar sempre numa posição de oposição e fazem-no em casa com os pais, professores e com os irmãos”.
Por outro lado, sublinhou que “o cinema venezuelano também tem sido crítico durante toda a sua história” e citou como exemplo os filmes de Clemente de la Cerda, Román Chalbaud, César Bolívar e Maurício Walerstein.
“Solveig Hoogesteijn, quando realizou ‘Macu: a Mulher do Polícia’ revolucionou a sociedade venezuelana, e foi o filme mais visto durante muitos anos na Venezuela”, disse.
Maria Helena Freitas insistiu que os venezuelanos são muito “proativos e criativos” e que “as vantagens de viver na Venezuela” passam também pela criatividade.
“Desenvolvemos a criatividade, a capacidade de sobrevivência, a imaginação, e somos pessoas especiais”, concluiu.
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