Governo recebeu 72 contributos na consulta pública do Estatuto da Cultura

De acordo com a tutela, num comunicado hoje divulgado, “durante o período de 30 dias úteis em que o Estatuto esteve em consulta, foram formalmente recebidos 72 contributos”.

O ministério, agradecendo “a todas as entidades e cidadãos que apresentaram sugestões e comentários”, refere que os contributos recebidos “serão agora alvo de uma atenta e detalhada análise” e que, “após este momento, prosseguirão as reuniões com as entidades representativas do setor, que têm tido um papel fundamental para a concretização deste importante trabalho”.

Várias estruturas representativas do setor têm criticado a proposta do Governo de Estatuto dos Profissionais da Cultura, aprovada em Conselho de Ministros em 22 de abril.

Na quinta-feira, dia em que terminou a consulta pública, a Associação de Artistas Visuais em Portugal (AAVP) e a plataforma cívica Convergência pela Cultura defenderam, respetivamente, que o estatuto “não responde aos problemas principais do setor” e que “as propostas com soluções que foram apresentadas pelos agentes do setor não foram consideradas pelo poder político”.

“O Estatuto, que se propôs responder à precariedade e insegurança dos profissionais da área da cultura com medidas capazes de mudar a realidade, não cumpre os seus objetivos. A proposta do Governo, tal como está, não responde aos problemas principais do setor: não estão previstos verdadeiros incentivos para a celebração de contratos de trabalho e não é assegurada uma proteção social eficaz que responda à intermitência dos rendimentos dos profissionais da cultura”, referiu a AAVP, em comunicado.

Para a Convergência pela Cultura, também em comunicado, está-se “perante um exercício feito para ser compreendido por fiscalistas, que deixa mais questões em aberto do que certezas”. Entende aquela plataforma que “o principal problema reside na interpretação do Ministério da Cultura relativamente ao que se compreende como integração dos trabalhadores que tutela”.

O Estatuto dos Profissionais da Cultura está em elaboração desde meados de 2020, quando o Governo anunciou a criação de um grupo de trabalho interministerial, “para análise, atualização e adaptação dos regimes legais dos contratos de trabalho dos profissionais de espetáculos e respetivo regime de segurança social”.

O grupo de trabalho contou também com contribuições de diversas associações representativas da Cultura.

Antes da AVPP e da Convergência pela Cultura, já outras entidades do setor tinham manifestado publicamente algumas reservas em relação ao estatuto.

Na terça-feira, no Parlamento, foram apontados, por algumas estruturas, “problemas muito graves” no documento, concluindo estas, de forma unânime, que o estatuto “não serve” o setor.

A Associação Portuguesa de Realizadores, a Associação Portuguesa de Empresários e Artistas de Circo (APEAC), a Plateia – Associação de Profissionais das Artes Cénicas, a Associação de Estruturas para a Dança Contemporânea (Rede) e a Performart – Associação para as Artes Performativas em Portugal foram ouvidas em audição na Comissão de Cultura e Comunicação da Assembleia da República, durante a manhã, sobre o novo estatuto, na sequência de um requerimento do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda (BE).

Na segunda-feira, em comunicado, a Ação Cooperativista considerou que o estatuto contém pressupostos imorais e que representam um recuo na situação laboral dos trabalhadores.

Na semana passada, o Sindicato dos Trabalhadores dos Espetáculos, do Audiovisual e dos Músicos (Cena-STE) lamentou que o Governo queira “instituir por muitos anos a manutenção, naturalização e legalização da precariedade” na Cultura, enquanto a Plateia considerou que, “para cumprir os objetivos, o estatuto tem de responder à precariedade e insegurança de todas as pessoas que trabalham no setor, com medidas capazes de mudar a realidade atual”.

No final de maio, a APR defendeu igualmente que o estatuto, “tal como está, não responde aos problemas principais do setor: não estão previstos verdadeiros incentivos para a celebração de contratos de trabalho e não é assegurada uma proteção social eficaz e que responda à intermitência dos rendimentos dos profissionais da cultura”.

Também no final de maio, a SOS Arte PT, que representa artistas visuais, considerou que “o estatuto carece de maior abrangência operacional”.

Ao querer abarcar a totalidade dos profissionais da cultura, “não tem em conta, em diversos aspetos, as especificidades inerentes a cada um dos setores, nomeadamente, no que diz respeito aos profissionais das artes visuais”, referem em comunicado.

O diretor-geral das Artes, Américo Rodrigues, reconheceu hoje, na conferência de lançamento do programa Europa Criativa, em Lisboa, que o estatuto “pode ser melhorado e reinventado, com o contributo dos artistas”, para revigorar “um setor artístico que é muito frágil” em Portugal “e luta há muitos anos pela dignidade dos criadores”.

“O setor [das artes] é muito frágil. Temos de o robustecer, enfrentar os problemas com a participação dos artistas”, considerou ainda o diretor-geral das Artes, apontando que as questões levantadas pelos participantes “são complexas e atravessam várias áreas”.

Em 02 de junho, no Parlamento, a ministra da Cultura, Graça Fonseca, também reforçou a disponibilidade do Governo para fazer alterações ao estatuto.

“Estamos disponíveis para ajudar, alterar. Estamos todos muito a tempo de introduzir alterações. Temos em Portugal um momento histórico para aprovar um estatuto global para o setor da cultura. Trabalhemos em conjunto em vez de trabalhar para o espelho”, afirmou Graça Fonseca na altura.

No comunicado hoje divulgado, o Ministério da Cultura salienta que o estatuto, “em estreita articulação com a Rede de Teatros e Cineteatros Portugueses e com a revisão do Modelo de Apoio às Artes — diplomas já regulamentados –, constituirá o terceiro eixo estratégico e fundamental para conferir maior estabilidade e sustentabilidade ao setor da Cultura, combatendo a precariedade laboral”.

“Para além de contribuir para a simplificação do cumprimento das obrigações contributivas, este Estatuto cria uma nova prestação social de proteção dos profissionais nas situações de suspensão da atividade artística”, destaca a tutela.

Entre os contributos recebidos pelo Ministério da Cultura estão “mais de 40 propostas de melhora do estatuto” remetidas pelo movimento “#DarVozACultura”, promovido pela Abreu Advogados e que reúne cerca de 50 profissionais de várias áreas da Cultura.

De acordo com a Abreu Advogados, em comunicado, “entre as propostas enviadas, destaque para o pedido de inclusão de subsídio de alimentação e contrato de trabalho obrigatórios; extinção dos recibos verdes; criação de uma Carteira Profissional para cada área da cultura; apoio aos sócios-gerentes, evitando situações como as ocorridas durante a pandemia em que artistas com empresas unipessoais ficaram excluídos de quaisquer apoios e, por fim, a atualização do prazo de aplicação do subsídio de suspensão involuntária da atividade artística para que se efetive logo após o primeiro mês sem atividade, e não após três meses como está agora previsto no Estatuto”.

Este movimento inclui, entre outros, o ator Albano Jerónimo, os músicos Carolina Deslandes, Tiago Bettencourt e Benjamim, os elementos da banda The Black Mamba, a ilustradora Clara Não e o ‘mentalista’ João Blümel.

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