Jorge Benvinda estreia-se a solo e canta sobre relações em "Vida a dois"

“Nunca escrevi de forma tão pessoal, ou pelo menos a falar desta forma, do amor, das fragilidades, da minha filha, da minha mãe, do meu pai. Sempre gostei de trabalhar de uma forma mais metafórica, e não tão direta, na forma como sinto as coisas”, partilhou Jorge Benvinda em entrevista à Lusa, via Zoom, a partir de Cabeça Gorda, aldeia do concelho de Beja onde vive.

O músico sentiu que, ao estar a falar de si num trabalho a solo, precisava de se dar: “Estava a sentir necessidade de mostrar um bocadinho do que sinto e que, afinal, este individuo também é humano”.

A carreira solo é “um complemento” da carreira musical de Jorge Benvinda, que continua ligado aos Virgem Suta e aos projetos Canções de Roda e Paião.

“A solo posso falar de coisas minhas e leva-me também a experimentar mais coisas e a aprender”, disse.

Até 2018, a vida profissional de Jorge Benvinda dividia-se entre a música e a restauração. Mas, nesse ano decidiu deixar os dois restaurantes que tinha, porque “aquilo já não dava pica nenhuma”. “E acabei por mudar de vida, fugir destas coisas que fazia com restaurantes e trabalhar só com música”.

O processo de criação do álbum a solo começou com a idealização de “canções fofinhas” que pudesse cantar com a namorada, Joana. “Fiz uma série de canções fofinhas para cantarmos os dois, mas entretanto não entraram só canções fofinhas [em ‘Vida a dois’], tinham que entrar outras que não fossem só deste género. Mas este foi o mote”, recordou.

Inicialmente, Jorge Benvinda pensou “trabalhar dez romances em dez canções”. “Fiz a primeira canção com um livro do José Luís Peixoto, ‘Livro’ — um resumo à minha maneira da obra – e surgiu a canção ‘Vida a dois’, que é um resumo de todas as canções do álbum, porque todas estas canções falam de relações”, partilhou.

Ao longo da entrevista, Jorge Benvinda foi cantarolando partes dos dez temas que compõem “Vida a dois” e contando um pouco de cada um.

Em “Está a chegar o amor”, o músico aflora um “pequeno arrufo” que teve numa manhã com a namorada e partilha como “à hora de almoço, quando ela chegou” sentiu que “estava a chegar o amor”.

Em “Namorados”, um dueto com Cláudia Pascoal, recorda “os primeiros namoros”.

Já em “Por ti” escreveu para a filha “quase um manual de instruções sobre como viver a vida, olhar para a vida”: “e sobretudo quando eu te faltar aceita isso de forma fácil e segue o teu rumo, acredita em ti, avança, não tenhas medo de avançar, o importante é ir sempre para Norte”.

“Willy Fog”, contou, remete para os momentos em que por vezes “gostava de voltar à infância”. “Às vezes sinto-me um bocadinho nessa pele de aventureiro que precisava de por uma mochila às costas e caminhar, o ‘Willy Fog’ fala um bocadinho sobre isto”, desvendou.

Em “Polvo” faz uma “chamada de atenção” para a poluição ambiental e lembra o “país em que se continua a pensar furar a costa para obter petróleo”. Neste tema, escrito na praia de São Torpes, perto de Sines, “onde um dia estava um pequeno polvo numa poça e várias pessoas à volta curiosas a verem-no”, Jorge Benvinda imagina que “o polvo foi parar ali propositadamente para ser apanhado e ir parar ao prato de alguém, para envenená-lo, como vingança pela forma como a Humanidade trata o mar e a morte de todos os seus amigos”.

Algumas canções, como “Prima”, contam coisas que não vivenciou diretamente: “É uma carta que uma mulher de 50 anos, a quem o marido já não liga e que está cansada da vida que leva na cozinha, simplesmente a cuidar da casa, escreve a uma prima. Chega ali àquela idade e pensa: ‘que se lixe, vou ser feliz'”.

No álbum, Jorge Benvinda assume “que a vida não é perfeita e que o mundo tem altos e baixos”. “Que um dia estamos com uma euforia de amor, e noutro dia sentimos que algo não está bem na nossa vida e temos saudades desse amor”, referiu.

“Vida a Dois”, produzido pelo músico João Pedro Coimbra, que Jorge Benvinda conheceu no Festival da Canção, em 2017, já estava pronto a ser editado há um ano, mas a covid-19 acabou por adiá-lo.

“O ano passado foi um ano estranho: ‘o que é que vai acontecer no futuro?’. Este ano já pensei: ‘se esta é a nossa realidade e se for para sempre, como é que dás a volta à tua vida?’. Aconteça o que acontecer, toquemos muito, pouco ou nada, eu tenho coisas para dar, quero continuar a gravar e a fazer álbuns”, disse.

Para conseguir editar o primeiro álbum a solo, Jorge Benvinda contou com o apoio da GDA (Gestão dos Direitos dos Artistas) e para o próximo, o músico também já está a candidatar-se a apoios. Mas caso não consiga, irá tentar “arranjar outra solução qualquer”, porque tem o objetivo de editar um segundo trabalho a solo em 2022.

“Vida a dois” terá, pelo menos, três apresentações ao vivo, no âmbito do OuTonalidades, organizado pela D’Orfeu Associação Cultural.

Até lá, ainda vai tentar convencer a namorada Joana a subir com ele a palco. “O meu objetivo é que a Joana me acompanhe, imagino-me ao vivo a cantar as músicas com ela. Ela não é profissional, nunca cantou ao vivo e só de eu falar nisso até treme”, confidenciou.

Com ou sem Joana, ao vivo Jorge Benvinda estará acompanhado por João Pedro Coimbra, Jorge Costa, Bruno Vasconcelos, Miguel Urbano, e, em algumas situações Gonçalo Narciso.

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