A exposição, que inaugura na sexta-feira, na Casa da América Latina, com entrada livre, tem como título ‘Paisagens, e não tanto’, com 16 trabalhos em pintura, nove deles recentes, criados no ano passado, em plena pandemia, e na sequência das manifestações por mais igualdade social no Chile.
“É uma espécie de pequeno milagre, esta exposição, dado os tempos que estão a correr”, comentou o artista, de 78 anos, contactado pela agência Lusa, que, devido à pandemia, tem estado fechado no seu atelier, próximo de casa, em Lisboa.
O título da exposição “vem das expressões políticas que ocorreram em outubro do ano passado em Santiago do Chile”, disse, sobre as manifestações para comemorar um ano de protestos, que levaram à intervenção da polícia, detendo mais de 600 pessoas, acontecimentos que Francisco Ariztia prefere não comentar, mas que o levaram a reagir, pintando.
As novas peças – nove ao todo – são de grande formato, “mas como o espaço permitia, foram incluídas [na mostra] outras obras anteriores, para descansar, porque aquelas sobre as manifestações são mais inquietantes”, descreveu o artista, radicado em Portugal desde 1975, vindo de França, depois de ter fugido ao regime de Pinochet.
“Estas manifestações em outubro de 2020, em Santiago do Chile, foram muito reprimidas pela polícia. Eu vi as imagens de longe, pela televisão e no Facebook. Eram muito impactantes, pareciam cenas de ficção. Obrigaram-me a responder de alguma maneira. Apesar dos quase 50 anos que vivo fora, queiramos ou não, o que acontece no lugar onde nascemos e passámos a infância, sempre está presente”, apontou o artista à Lusa.
Francisco Ariztia espera que o público veja os quadros e “se estabeleça um diálogo” sobre aquela expressão plástica dos acontecimentos no Chile, onde nasceu, em 1943, estudou na Escola Nacional de Belas Artes, na Universidade do Chile, e partiu, em 1966, com uma bolsa de pós-graduação, para Belgrado, na antiga Jugoslávia, para trabalhar em oficinas livres de gravura e pintura na Escola de Belas Artes da cidade.
Em 1968 obteve também uma bolsa de pós-graduação na École Nationale Supérieure des Beaux-Arts de Paris, e ente 1970 e 1972 viveu e trabalhou em Bolonha, Itália.
Regressou ao Chile em 1972, onde trabalha como monitor na Casa da Cultura de Chuquicamata, criou oficinas e coopera com jovens atores e poetas, partindo de novo para França em 1973, por motivos políticos, onde realizou um estágio no Museu da Abadia Sainte Croix, em Sables d’Olonne, sendo convidado em 1974 para participar na Bienal de Veneza.
“Depois de viver em vários países voltei ao Chile, em 1972, com esperanças de mudança, mas deu-se o golpe de estado de Pinochet, em 1973”, e acabou por deixar de novo o país: “Por sorte estou vivo. Em França, vimos o 25 de abril [em Portugal] pela televisão de um café, e era o reverso da medalha. Caía o meu país e subia o dela” [da mulher, que é portuguesa].
Em 1975, quando chegou a Portugal, pintou, no Centro Cultural de Alcântara, um mural alegórico ao 25 de Abril, com o título “Do tempo da outra Senhora ao tempo novo”, e fez vários painéis e pinturas para os filmes do realizador chileno Raul Ruiz.
De 1989 a 1991 foi bolseiro da Fundação Calouste Gulbenkian, e professor de desenho e pintura na Sociedade Nacional de Belas Artes de Lisboa.
“Continuo a trabalhar, é a única maneira de poder estar comigo e tranquilo”, comentou, sobre a pandemia, apontando ainda “a sorte de ter um atelier que está perto de casa”, na capital.
“Ainda bem que estou em Portugal, é o país mais ‘vivível’ neste momento, e mais parecido com o Chile, porque tem semelhanças no caráter, melancólico e poético”, comparou o criador chileno.
De 1998 a 2002, Francisco Ariztia foi nomeado adido cultural da Embaixada do Chile em Portugal, e criou um mural de azulejos realizado a partir de um original de Roberto Matta, situado na parte norte do Parque das Nações.
Em 2005 e 2006 participou na ARCOmadrid – Feira Internacional de Arte Contemporânea, em Madrid.
Participou em várias exposições no Chile, França, Itália, Reino Unido, Alemanha, Portugal, Espanha, Estados Unidos da América, Holanda, Sérvia e Uruguai, e a sua obra está representada no Museu de Arte Contemporânea de Santiago do Chile, no Museu de l’Abbaye Ste Croix, em Sables d’Olonne (França), no Museu de Sassoferrato (Itália), no Museu de Arte Moderna de Bochum (Alemanha), e no Museu de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa.
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