‘Mortal e Rosa’, de Francisco Umbral, sobre filho, é apresentado hoje

Editado pela Tinta-da-China e traduzido por Carlos Vaz Marques, que assina o posfácio, este livro de 1975, da autoria do escritor espanhol Francisco Umbral (1932-2007), é “avassalador sobre a morte de um filho e a sacralidade da infância”, como descreve a editora.

A sessão de lançamento, que decorre hoje pelas 19:30 no encontro literário Correntes d’Escritas, contará com a leitura de excertos do livro por Carlos Vaz Marques.

No posfácio, fala de um “sofrimento incompreensível” que descobriu na leitura de um livro que lhe chegou sem filtros nem aviso, e que o marcou “como muito poucas leituras” antes ou depois daquela.

“A linguagem simultaneamente velada e crua com que é contada a morte de um filho, repassada de dor e transtornada pela alucinação da dor, fez-me sentir a verdade profunda e profundamente literária destas páginas”, escreve o jornalista e tradutor.

“‘Mortal e Rosa’ é a morte do filho e, mais do que isso, uma mundividência desesperada que decorre dessa tragédia, entendida não apenas como tragédia pessoal, existencial, mas como tragédia universal, cósmica, definitiva. Nada faz sentido depois disto e se nada faz sentido há que inventar sentidos mínimos, funcionais, numa pantomima de esperança que, sendo máscara, disfarce a verdadeira face do esqueleto que todos trazemos por dentro”, acrescenta Carlos Vaz Marques.

O filho de Francisco Umbral tinha seis anos quando morreu de leucemia e o escritor nunca ultrapassou essa tragédia, tendo-a sofrido durante a vida e após a sua morte.

Numa entrevista apresentada no programa Imprescindibles, uma série de documentários sobre as figuras mais importantes da cultura espanhola no século XX, transmitido pela televisão pública de Espanha, Francisco Umbral referiu-se à doença do filho — Pincho — como “uma coisa atroz”, que o deixou zangado com o mundo e com Deus.

“Uma vez, quando ele estava na clínica, eu subia no elevador para o ir ver, e uma tia disse-me, ainda por cima numa altura em que a criança estava numa crise mortal: ‘Como está o menino?’ E eu disse-lhe: ‘Muito mal’. E ela respondeu-me: ‘O que podemos fazer, se é o que Deus quer…’ E eu disse-lhe: ‘Ah, isto é o que Deus quer? Que cabrão, não?'”, contou o autor.

Em “Mortal e Rosa”, Francisco Umbral constrói um longo monólogo em que a morte do filho converte o seu pesadelo humano numa força catártica e libertadora.

Na sexta-feira, às 15:30, terá lugar, também no Correntes d’Escritas, o lançamento do novo romance do também escritor espanhol Manuel Vilas, que marcará presença no encontro literário.

“Os beijos” sucede-se aos aclamados romances “Em tudo havia beleza” e “E, de repente, a alegria”, para contar uma história de amor no meio de uma crise mundial, em que uma mulher e um homem tentam regressar ao amor e ao erotismo, “esse lugar misterioso onde os seres humanos procuram o sentido mais profundo da vida”, descreve a Alfaguara que edita a obra do escritor em Portugal.

A história começa em março de 2020, quando um professor reformado abandona Madrid, cumprindo ordens médicas, e instala-se sozinho numa casa na floresta, nas proximidades de uma pequena povoação. Ali conhece uma mulher “hipnotizante”, quinze anos mais nova, e entre os dois germina uma inesperada relação de confiança, alimentada por uma cadeia de revelações surpreendentes.

Os encontros sucedem-se e estas duas vidas marcadas pela solidão apaixonam-se e vão construindo uma relação madura, mesmo se assombrada pela realidade de corpos que já perderam a juventude, pelas memórias de um passado que teima em reaparecer e pela estranheza de se encontrarem numa era que apanhou a humanidade de surpresa.

Esta não é a primeira vez que Manuel Vilas comparece no Correntes d’Escritas, tendo marcado presença em 2019, para lançar o seu primeiro romance, “Em tudo havia beleza”, que lhe valeu o Prémio Femina Estrageiro e foi finalista do Prémio Planeta.

A seguir a este lançamento, às 16:15, segue-se o de “Um cão deitado à fossa”, de Carla Pais, romance que em 2018 venceu o Prémio Literário Cidade de Almada, e que vai ser editado pela Porto Editora.

“Uma serração. Dois irmãos. Dois pesos e duas medidas. A um deles, o mais frágil, o pai tudo dá. Ao outro, reserva toda a sua indiferença e despeito. E entre o barulho da serra, que não para nunca, e o silêncio do pai, cresce Urbano, atrás da sombra da mãe, que se verga, submissa, ao marido”, descreve a sinopse da obra.

Trata-se de um romance que cruza dois registos narrativos diferentes.

Por um lado, uma história de vidas marcadas por uma infelicidade de natureza psicológica e afetiva, e onde um modo machista e repressivo de estar no mundo orienta, através de linguagem grosseira, comportamentos cruéis e atitudes violentas.

Por outro lado, há uma espécie de libelo acusatório desse universo tipificado por homens egoístas e mulheres submissas, escrito num registo literário completamente diferente e “estilisticamente muito cativante, mas de grande contundência”, como descreveu na altura o júri do prémio.

O júri considerou que embora a atmosfera do romance seja a de uma “ruralidade fechada nos seus próprios fantasmas”, esta é uma história “muito agradável de ler”, porque o tom violento e desesperado “emerge de uma escrita cujo alcance literário deve ser reconhecido pela sua qualidade imagística e harmonia estilística”.

O encontro literário Correntes d’Escritas começou na terça-feira, com iniciativas dedicadas a professores e às escolas, teve hoje abertura oficial, com anúncio do Prémio Literário Casino da Póvoa/Correntes d’Escritas, atribuído a Luísa Costa Gomes, pelo o livro de contos “Afastar-se”, e decorre até dia 26, contando com a presença de 60 escritores de expressão ibérica.

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