Percurso sonoro-performativo e instalação contam histórias das ‘Bravas’

O projeto desenvolvido pela Associação Cultural Pele será apresentado na sexta edição do MEXE – Encontro Internacional de Arte e Comunidade que decorrerá entre os dias 18 de setembro e 03 de outubro nas cidades de Porto, Lisboa e Viseu.

‘As Bravas’ são mulheres do Porto e de Amarante que partilharam histórias das suas vidas, agora mostradas num percurso sonoro e performativo que irá percorrer as ruas do Bonfim, no Porto, e na instalação imersiva ‘ARCA’, patente na galeria Ars Longa Vita Brevis, na Rua da Alegria.

Estes momentos são o resultado de mais uma iniciativa desenvolvida no âmbito do projeto Enxoval, que começou em 2019 e conta com o apoio da Fundação Calouste Gulbenkian, através do programa Práticas Artísticas para a Inclusão Social (PARTIS).

O Enxoval tem como objetivo “trabalhar as questões de género: igualdade de género, estereótipos, mas também a passagem de testemunho, de histórias, canções, concelhos de geração para geração”, explicou à Lusa Inês Lapa, codiretora artística de ‘As Bravas: Um manifesto’.

Neste projeto que é agora apresentado no festival MEXE, o percurso desenhado pelas ruas do Bonfim “vai passar por alguns sítios simbólicos, ligados com a história de mulheres, como a questão do assédio, ou da invisibilidade”.

Uma dessas histórias é a de Lucelina Rosa, de 40 anos, que viajou do Brasil para o Porto há dois anos, com o seu companheiro, para trabalhar, mas “também em função da situação política em que o Brasil se encontra neste momento”, contou à Lusa.

“A história que eu partilhei, na verdade, foi vivenciada aqui mesmo. É interessante perceber que mudamos de sítio, mas as experiências continuam a ser as mesmas”, diz.

Foi no metro do Campo 24 de Agosto que viveu uma situação de assédio que a marcou.

“Fiquei tão chocada naquele momento. Fui olhada como um pedaço de carne, como se estivesse nua, [mas estava] vestida normalmente, como estou agora. Na hora, fiquei sem reação. Ele passou e continuou a olhar e a passar. Falou alto, como se fosse estivesse tudo tranquilo”, descreveu.

Confrontou-o e disse que o ia filmar. Nessa altura, “ele começou a correr, pegou o elevador e foi embora”.

“Quem diz que são só palavras é porque nunca passou por essa situação na pele. Há que respeitar esses relatos, há que se pensar na educação dos homens, para que respeitem as mulheres de forma profunda, para que não olhem para elas como se fossem um pedaço de carne para ser consumido”, considera Lucelina.

Também na instalação há um “mini-percurso”, conta a codiretora artística Janne Schröder, que é construído com nichos diferentes.

‘Corpo e Intimidade’, onde se exploram, por exemplo, mitos sobre o período ou métodos de contraceção, ‘Denúncia e Silêncio’, com histórias de sobre o casamento, violência doméstica e a viuvez como libertação, ‘Emancipação e Empoderamento’, que mostra a luta de homens e mulheres, e, por último, o ‘Novo Enxoval’ mostra objetos que simbolizam independência e força.

Exemplo dessa força é Marília Paredes, de 81 anos, que conta a história das mulheres, dos direitos das mulheres e dos problemas das mulheres que, ainda hoje, se sentem na pele.

Sempre foi “contestatária”, por isso considera que não sofreu muito, mas dois dedos de conversa bastam para recordar histórias de assédio que remontam à sua infância.

Para esta ‘Brava’, “a mentalidade é lenta e a vida é curta”.

“Nunca vamos chegar a ver as mentalidades a mudarem-se totalmente”, considera.

O caminho traçado na exposição termina com um convite a participar num bordado coletivo, que já vem sendo alinhavado desde 2019.

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