Stereossauro recorda "tarde memorável" na regravação de ‘O Cacilheiro’

 

A nova versão de ‘O Cacilheiro’, tema incluído no álbum ‘Homem na Cidade’, de 1977, composto por Paulo de Carvalho e escrito por Ary dos Santos, foi uma das últimas colaborações de Carlos do Carmo, que morreu hoje, em Lisboa, aos 81 anos.

‘Cacilheiro’, versão de Stereossauro, criada “com a ajuda do The Legendary Tigerman e do Ricardo Gordo, na guitarra elétrica e na guitarra portuguesa, respetivamente“, faz parte de ‘Bairro da Ponte’, álbum que o DJ e produtor editou no início de 2019 e onde “a tradição está enrolada com a modernidade e vice-versa”, em 19 temas.

Stereossauro recordou à Lusa que o “grande responsável” e “grande arquiteto por detrás desta colaboração” foi um dos filhos do fadista, Alfredo ‘Becas’ do Carmo.

“Ele é que mostrou um tema [no qual Stereossauro usava um ‘sample’ de um fado de Carlos do Carmo] ao pai e sugeriu que fizéssemos alguma coisa juntos”, partilhou.

O DJ e produtor confessa que, antes de enviar a nova versão instrumental de “O Cacilheiro” para Carlos do Carmo ouvir, “estava até um bocado a medo, um bocado apreensivo”.

“Eu não conhecia pessoalmente o Carlos do Carmo, não sabia qual ia ser a sua reação. E, para minha grande surpresa, ele gostou imenso do tema”, disse.

Os dois conheceram-se no dia em que Carlos do Carmo foi gravar as vozes. “Passámos uma tarde no estúdio e foi um momento memorável. Ele tem uma carisma e uma presença, daquelas [pessoas] que entra numa sala e fica tudo calado só a ouvi-lo falar. Era uma pessoa que transmitia uma aura boa e uma calma”, contou.

Nessa tarde, Carlos do Carmo partilhou com Stereossauro que “O Cacilheiro” “inicialmente era um tema com uma sonoridade bossa nova, sul-americana, uma coisa assim mais mexida, mas que a certa altura eles decidiram transformar num fado e gravar o fado”.

“Curiosamente, na versão que eu fiz tinha posto bastantes percussões, uma coisa mais dançável, sem saber como fui mais ou menos para a ‘vibe’ inicial, mas sem fazer ideia, sem o conhecer. E ele disse que isso foi logo uma das coisas que o fez gostar muito da versão, e querer ir para estúdio cantar”, recordou.

Apesar de ter sido “uma experiência muito rápida”, é daqueles momentos que o DJ e produtor irá “guardar para sempre”.

Embora tenha crescido numa família onde se ouvia fado, foi já “depois dos 30” que Stereossauro despertou para este género musical.

“Foi por causa do hip-hop e do ‘sampling’ que, ao estar a investigar discos de fado, comecei a redescobrir os discos dos grandes fadistas portugueses, sendo que o Carlos do Carmo é uma figura central. Foi uma coisa que comecei a ouvir por estar a pesquisar sons e a tentar perceber o que era o fado e, passado pouco tempo, dei por mim a ouvir discos de fado sem ser para samplar, só para apreciar a música”, partilhou.

Carlos do Carmo morreu hoje, aos 81 anos, no Hospital de Santa Maria, em Lisboa.

Nascido em Lisboa, em 21 de dezembro de 1939, era filho da fadista Lucília do Carmo e do livreiro Alfredo Almeida, proprietários da casa de fados O Faia, onde começou a cantar, até iniciar a carreira artística em 1964.

Vencedor do Grammy Latino de Carreira, que recebeu em 2014, entre outros galardões, o seu percurso passou pelos principais palcos mundiais, do Olympia, em Paris, à Ópera de Frankfurt, na Alemanha, do ‘Canecão‘, no Rio de Janeiro, ao Royal Albert Hall, em Londres.

O cantor despediu-se dos palcos em 09 de novembro de 2019, com um concerto no Coliseu dos Recreios, em Lisboa.

A publicação do seu derradeiro álbum, “E Ainda?”, prevista para o passado mês de novembro, foi anunciada hoje, para este ano, pela discográfica Universal Music.

O Governo decretou um dia de luto nacional para segunda-feira, pela morte de Carlos do Carmo.

 

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