Surma dá "grito de libertação" em ‘alla’, um disco sem género

Há cerca de cinco anos, Débora Umbelino saia do anonimato e transformava-se em Surma, com o lançamento do álbum ‘Antwerpen’. Em 2019, participou no Festival da Canção com o tema da sua autoria, ‘Pugna’, e fez parte da banda sonora de ‘Snu’, o filme que conta a história de amor entre Francisco Sá Carneiro e Snu Abecassis.

Meia década (e uma pandemia) depois, Surma regressa com um novo álbum e uma ‘nova persona’. Em entrevista ao Notícias ao Minuto, a artista descreveu ‘alla’ como “um grito de libertação” e de “maturação” do seu “eu interior”.

Na verdade, a cada música que percorremos neste novo disco, bastante eclético, sentimos cada vez mais que estamos perante uma autobiografia de Surma. Uma autobiografia bastante íntima que aborda temas tão importantes como o conceito de identidade, bullying, autosuperação, empoderamento, insegurança, vulnerabilidade. ‘alla’ é, como a própria artista descreve, “um trabalho sem qualquer muro a separar géneros ou identidades”.

Depois de apresentar o disco em Lisboa, no passado mês de dezembro, Surma vai agora atuar, no dia 27 de janeiro, no ‘O Salgado Faz Anos… FEST!’, no Maus Hábitos, no Porto.

Já no dia 25 de fevereiro, a artista vai estar no Botanique, em Bruxelas, no dia 15 de março, no SXSW, em Austin, no Texas e, no dia 22 de março, no Teatro Académico Gil Vicente, em Coimbra.

Entre estes concertos, Surna fará ainda várias sonoplastias ao vivo da peça de teatro ‘Sob A Terra’ e Concertos Para Bebés.

É como um grito de libertação para mim

No seu novo disco ‘alla’ aborda temas muito pessoais como a identidade, a androginia e o bullying. O que pretende transmitir com este novo trabalho? É uma espécie de catarse?

Posso dizer que sim. Não gosto muito de trazer o assunto “pandemia” às conversas dos dias de hoje, mas a paragem repentina daqueles três meses deu-me o devido tempo para explorar vários temas que já andavam na minha cabeça há imenso tempo. Das crises existenciais à leitura de vários livros sobre estes temas e à exploração do meu “eu” interior, trouxe-me essa exploração e maturação que necessitava para entrar nestes mundos. É como um grito de libertação para mim. 

Daí a palavra ‘alla’ ter sido escolhida para dar título a este “grito”…

‘alla’ é uma palavra sueca, sem género, que significa ‘todes’. Um todo sem qualquer género ou barreira. Fez todo o sentido para mim. É exatamente esse significado que quero dar neste trabalho. Um trabalho sem qualquer muro a separar géneros ou identidades, sem julgamentos. É esse o meu principal objetivo enquanto Surma: a disrupção do ideal que a sociedade tem em mente ou o que as pessoas querem que sejamos. 

Cinco anos separam ‘Antwerpen’ e ‘alla’. O que fez durante este tempo?

Tive a sorte de tocar imenso em Portugal e internacionalmente, de poder colaborar com artistas inacreditáveis e de fazer parte de vários projetos de variadas áreas artísticas, como o teatro, o cinema, a dança, as artes plásticas, a pintura, etc, com que já queria trabalhar há muito tempo. Foi isso que me inspirou bastante para toda a atmosfera e universo de ‘alla’.

Como sente que evoluiu, enquanto artista, entre estes dois projetos?

Acho que a maior evolução que tive entre estes dois projetos foi mesmo uma evolução extrema a nível pessoal, que me fez ver, de um modo muito mais positivo e com outra perspetiva, o caminho que queria levar enquanto artista. Temos que estar bem connosco mesmos para podermos levar o melhor (e até mesmo o pior) de nós às pessoas. Estou uma pessoa completamente diferente de há cinco anos para cá. Comecei a ver muitas coisas que, na altura, via como uma fragilidade ou até mesmo como uma inferioridade da minha pessoa em relação a várias situações, que me traziam demasiadas inseguranças, o que me fez fechar muito em mim e a não falar. Daí “vulnerabilidade” ter sido uma palavra de força e de persistência a nível pessoal e artístico. Posso dizer que me sinto muito bem comigo mesma, neste momento. Comecei a fazer terapia (um tema que deveria deixar de ser tabu), o que me ajudou imenso a falar e a colocar todos os meus problemas cá para fora, e a não guardar para mim mesma. Sinto-me mais leve e mais segura. Essa evolução trouxe-me muitas coisas positivas enquanto artista. Precisava desta evolução pessoal para ter esta evolução artística.

‘alla’ conta com várias colaborações. Como escolheu os artistas para as mesmas?

São amigos meus de longa data, com quem já queria colaborar há uma eternidade, não em conceito de álbum, mas em conceito de lançar várias músicas ao longo do ano. Acabou por acontecer juntar todos neste disco, porque fez todo o sentido para mim. Já produzo sozinha há tanto tempo e gosto muito de absorver várias técnicas de produção e vários géneros musicais e de composição, diferentes daquilo a que estou habituada. Aprendi imenso e foram dias tão mas tão inacreditáveis em estúdio. A pandemia também me trouxe isso mesmo: Apesar de ser bastante “bicho do mato”, senti muito a falta de poder fazer música ao lado de amigos e de poder ter diversas opiniões externas. Aconteceu tudo naturalmente, sem forçar nada. Foi uma partilha muito bonita de vários mundos distintos, mas que, no fundo, foram desaguar a uma narrativa muito própria para este ‘alla’ .

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