O grupo informal Vigília Cultura e Artes surgiu em 21 de maio do ano passado para promover um protesto, homónimo, que decorreu em 17 cidades portuguesas.
“A única coisa que podemos fazer um ano depois é um velório, e vamos velar todos os profissionais da Cultura que foram deixados para trás por este Governo e por todos os deputados que estão sentados na nossa Assembleia da República”, afirmou a atriz Anaísa Raquel, em declarações à Lusa, em nome daquele grupo informal.
Quando questionada sobre o que mudou de há um ano para cá para os profissionais de um dos setores mais afetados pela pandemia da covid-19, Anaísa responde perentoriamente: “nada”.
“A desproteção social continua, o facto de termos profissões não regularizadas continua, o facto de termos espetáculos cancelados e não pagos continua. Todas as medidas que foram implementadas pelo Governo são muito parcas, nunca chegaram a todos”, afirmou.
Para esta atriz, numa análise aos critérios definidos para atribuição dos apoios “vê-se perfeitamente que vêm de gabinetes que não conhecem quem são os profissionais da Cultura”.
“Nós temos muitos, mas mesmo muitos profissionais, com os CAE [Código de Atividade Económica] e os CIRS [Código de IRS] mal colocados e que, por isso, não chegam a ter nenhum apoio, e falo por exemplo deste apoio de 1 IAS [apoio social extraordinário para os profissionais da Cultura, anunciado em 14 de janeiro como único e entretanto estendido a três meses]”, alertou.
Anaísa Raquel salienta que “aquilo que o Ministério da Cultura tem feito em termos de apoios são apoios à criação”.
“Vamos ver, por exemplo, o Garantir Cultura, em que se pede que os projetos sejam de criação e sejam implementados num prazo máximo de nove meses. Todos os equipamentos culturais estão com ‘sobreagendamento’, não há forma de conseguirmos que todos aqueles que forem elegíveis no apoio à criação do Garantir Cultura venham a ter um palco”, afirmou.
A atriz considera que “chega a ser uma falta de respeito e até ridículo” que, num ano de pandemia em que os profissionais da Cultura foram “proibidos de trabalhar, de exercerem as suas profissões, os únicos apoios verdadeiros que aconteçam sejam apoios à criação e que nem sequer chega a abranger todas as profissões do setor da Cultura”.
“Porque a Cultura não são os artistas, são os cenógrafos, os técnicos, os artesãos, também há Cultura nos bares, na restauração. Os eventos fazem parte da Cultura”, disse.
Tal como no protesto do ano passado, o grupo Vigília Cultura e Artes continua “a ter as preocupações no que diz respeito às medidas de segurança”. Por isso, será pedido a todos os que se desloquem até aos velórios, “que se façam acompanhar de máscara e álcool gel”.
Além disso, o grupo vai pedir que as pessoas, “à semelhança daquilo que acontece num velório, vão chegando, depositando a sua flor num elemento que está no local e que faz parte de todos os velórios e que depois não permaneçam muito tempo na via pública, para garantir a segurança”. “Porque sabemos que estamos a viver ainda uma pandemia”, frisou.
Em Lisboa, o velório irá decorrer entre as 10:00 e as 17:00 em frente à Assembleia da República.
Também haverá velórios noutras cidades, no continente, como Porto, Évora e Aveiro, e nas ilhas, Madeira e Açores.
“Contamos ter ou as mesmas 17 cidades [que na vigília de 21 de maio de 2020] ou mais”, adiantou Anaísa Raquel.
Em maio do ano passado, dois meses depois de a atividade cultural ter parado em Portugal, a vigília foi marcada para “dar visibilidade” à luta de anos num setor cujas fragilidades a pandemia da covid-19 “tornou mais evidentes”.
A paralisação da Cultura começou na segunda semana de março de 2020, depressa se estendeu a todas as áreas e, no final desse ano, entre ‘plano de desconfinamento’ e novos estados de emergência, o setor somava perdas superiores a 70% em relação a 2019.
Este ano, em 15 de janeiro, todos os equipamentos culturais voltaram a fechar, no âmbito das medidas decretadas pelo Governo para conter a pandemia da covid-19.
Entretanto, as atividades culturais começaram a ser retomadas, faseadamente, em 15 de março, dia em que puderam reabrir livrarias, lojas de discos, bibliotecas e arquivos.
No que ao setor da Cultura diz respeito, em 05 de abril puderam reabrir museus, monumentos, palácios, galerias de arte e similares.
Em 19 de abril, podem reabrir teatros, auditórios, salas de espetáculos e cinema, e podem também ser retomados os “eventos no exterior, sujeitos a aprovação da Direção-Geral da Saúde”.
Em 03 de maio, poderão voltar a realizar-se “grande eventos exteriores e interiores, sujeitos a lotação definida” pela Direção-Geral da Saúde (DGS), o que pode vir a incluir festivais.
Na apresentação do ‘plano de desconfinamento, em 11 de março, o primeiro-ministro, António Costa, salientou que o processo de reabertura “está sujeito sempre a uma reavaliação quinzenal, de acordo com a avaliação de risco” adotada.
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