A informação foi avançada hoje à agência Lusa por Rui Galveias, dirigente do Cena- STE, que acrescentou que as reuniões já tinham sido solicitadas aos grupos parlamentares e que o primeiro encontro decorrerá já na terça-feira.
O dirigente sindical não precisou, todavia, o calendário das reuniões com os grupos parlamentares, nem os identificou, sublinhando que a intenção é que os encontros ocorram antes de 3 de novembro, quando está prevista a ida da ministra da Cultura à Assembleia da República, para discussão do OE2022 para o setor.
Rui Galveias falava à agência Lusa no final de uma reunião entre a ministra da Cultura, Graça Fonseca, e as estruturas representativas dos artistas que contribuíram para a versão preliminar do Estatuto dos Profissionais da Cultura.
Realizada na Biblioteca Nacional de Portugal, no Campo Grande, em Lisboa, a reunião foi convocada, na sexta-feira, por Graça Fonseca, e destinou-se a dar a conhecer às “mais de uma dezena de estruturas”, que contribuíram para a elaboração do documento, a versão final do Estatuto aprovado na quinta-feira, em Conselho de Ministros, disse hoje de manhã à Lusa fonte do Ministério.
Segundo Rui Galveias, o encontro de hoje “limitou-se à apresentação da versão final e do ‘powerpoint'” daquele documento.
O encontro de hoje “não traz nada de novo”, acrescentou Rui Galveias à Lusa, frisando que o documento aprovado em Conselho de Ministros “continuará em vigor”, mesmo que o OE2022 seja chumbado. A discussão do OE, na generalidade está marcada para quarta-feira na Assembleia da República.
O Cena-STE “continua com a mesma preocupação muito grande” em relação ao novo diploma, pois continua sem saber “que verbas estão consignadas no Orçamento que sustentem o Estatuto”.
“Perguntámos, por exemplo, com que verbas se vai sustentar a exigência de contratação e de cumprimento da lei dentro das estruturas públicas para combate à precariedade, nomeadamente em fundações apoiadas pelo Ministério da Cultura ou organismos como a DGArtes, e a senhora ministra não nos respondeu”, frisou.
Para o dirigente do Cena-STE, é necessário que os profissionais do setor saibam “com que verbas isso se faz”, já que é “impossível fazê-lo” sem reforço de orçamento.
O Estatuto dos Profissionais da Cultura, uma reivindicação do setor com pelo menos duas décadas, começou a ser desenhado em meados de 2020, quando o Governo anunciou a criação de um grupo de trabalho interministerial, “para análise, atualização e adaptação dos regimes legais dos contratos de trabalho dos profissionais de espetáculos e respetivo regime de segurança social”.
O grupo de trabalho contou também com contribuições de diversas associações representativas da Cultura.
Uma versão preliminar do documento fora aprovada em Conselho de Ministros, em 22 de abril deste ano, seguindo-se depois um período de consulta pública, que terminou em junho, tendo o Ministério da Cultura anunciado na altura que recebeu 72 contributos.
Em 14 de julho, numa audição parlamentar, a ministra da Cultura, Graça Fonseca, disse que em setembro seriam retomadas as reuniões com as entidades que estiveram envolvidas no processo de construção do estatuto. Na altura, a ministra reiterou a “disponibilidade do Governo” para o diálogo. No entanto, segundo as estruturas representativas dos trabalhadores do setor, tal não aconteceu.
No final da reunião do Conselho de Ministros da semana passada, a ministra da Cultura anunciou que, ao abrigo do decreto-lei, os trabalhadores da Cultura passam a ter direito, ao fim de um mês de inatividade, a um subsídio similar ao subsídio de desemprego, que variará entre 438,81 euros e 1.097 euros.
No estatuto consta ainda uma “nova taxa contributiva a pagar pelas entidades que optem por celebrar contratos de prestação de serviços”, disse a ministra, referindo-se ao “combate aos recibos verdes”.
De acordo com Graça Fonseca, as entidades empregadoras terão “uma nova obrigação declarativa de fundamentação do porquê dessa opção” de celebração de contrato de prestação de serviço.
Além disso, “foi criado um regime próprio de fiscalização e um regime agravado de contraordenações”.
O Estatuto dos Profissionais da Cultura integra o registo profissional, o regime contratual de trabalho e o regime de proteção social e aplica-se “aos profissionais das artes do espetáculo, do audiovisual, das artes visuais e da criação literária, que exerçam uma atividade autoral, artística, técnico-artística ou de mediação cultural”, como indica o Governo.
Hoje, num comunicado conjunto da Associação Portuguesa de Realizadores (APR) e da Plateia, as duas estruturas enumeram “três desmentidos” em relação à versão final do estatuto, aprovado na generalidade, na quinta-feira.
“Ao contrário do que a ministra da Cultura afirmou, a versão final do Estatuto não resultou de muito diálogo”, o “acesso à nova prestação por suspensão de atividade cultural é altamente limitado” e o estatuto “não combate a precariedade”, lê-se no texto.
No que respeita ao acesso à nova prestação por suspensão de atividade cultural, a APR e a Plateia consideram que apenas pode aceder a este novo subsídio “uma parte das pessoas que trabalham na cultura”, já que o acesso “é exclusivo a quem trabalha através de contrato de trabalho de muito curta duração ou através de recibos verdes, estando todas as outras pessoas de fora, nomeadamente a maioria das situações de trabalho por conta de outrem”.
“O Governo não reconhece e não quer combater a precariedade laboral na Cultura. Tudo o que é referido no Estatuto sobre este aspeto é apenas o que já decorre das leis laborais”, afirmam.
Na sexta-feira, associações representativas dos trabalhadores da Cultura mostraram-se “indignadas” e “desiludidas” com a aprovação do Estatuto dos Profissionais do setor pelo Governo e mostrando receio de que venha a “aumentar a informalidade e agravar a precariedade” neste setor.
“O que nós temos, sobretudo, são desconfianças e preocupações”, disse, na altura, o dirigente sindical Rui Galveias, do Cena-STE.
A questão dos prazos de garantia e a forma como se chega ao subsídio de cessação da atividade, “que não [se sabe] como é que se vai chamar, mas é uma espécie de subsídio de desemprego”, são, segundo Rui Galveias, alguns dos motivos de preocupações para o sindicato.
Também Salomé Lamas, da direção da Associação de Artistas Visuais em Portugal (AAVP), disse que a entidade recebeu esta notícia “com enorme desagrado e frustração, porque o documento parece um chapéu que serve a todos, mas afinal não serve a ninguém”.
“Estamos indignados, tristes e desiludidos”, expressou Salomé Lamas, acrescentando que há um sentimento de as associações que participaram no processo terem sido “defraudadas”.
Ainda na sexta-feira, a Convergência pela Cultura considerou, num comunicado, que a aprovação, por parte do Governo, “de um estatuto criado com base na adulteração é uma demonstração do desrespeito pelos contributos dos agentes culturais, que já manifestaram a sua indignação pelo facto deste diploma encontrar-se longe do modelo final”, acusando a ministra de “faltar à palavra relativamente à continuidade das reuniões para discussão dos principais pontos que se encontram por resolver”.
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