Em declarações à Lusa, Manuel Begonha, dirigente da Associação Conquistas de Abril (ACA), que organiza as comemorações, afirmou que Vasco Gonçalves (1921-2005) é “uma figura fundamental do 25 de Abril” e seria “imperdoável” deixar passar a data do centenário em branco.
“Não só porque era um homem que tinha características de grande cultura, era um homem que colaborou ainda no golpe da Sé [em 1959, contra a ditadura de Salazar] e tinha uma notável formação em termos políticos. Era um homem que leu os clássicos marxistas todos, movia-se muito bem no materialismo histórico”, disse Manuel Begonha, que participou ativamente no processo do 25 de Abril, como membro da 5.ª Divisão do EMGFA, onde coordenou as campanhas de dinamização cultural no país.
As comemorações do nascimento de Vasco Gonçalves, em 03 de maio de 1921, são organizadas pela Associação Conquistas de Abril (ACA), criada há dez anos para “preservar, divulgar e promover o apoio dos cidadãos aos valores e ideais da Revolução”, o “momento mais luminoso da História de Portugal”.
Manuel Begonha critica “as autoridades”, o Governo, o Presidente da República, por nada fazerem sobre a data.
E como nem o Governo nem o Presidente da República tomaram qualquer iniciativa, “teve que ser a associação a assumir esse papel, porque era imperdoável não fazer qualquer tipo de comemoração para o homem que foi tão importante”, justificou.
O programa de comemorações do centenário prolonga-se ao longo deste ano, mas a organização admite que as datas das sessões, em Lisboa e Porto, possam ser alteradas consoante a evolução da epidemia em Portugal.
Para 08 de abril está prevista uma sessão no Porto e passado um mês, em 08 de maio, na Voz do Operário, em Lisboa, haverá uma sessão comemorativa mais alargada do que aquela que se fará, na sede da ACA, em 03 maio, dia de nascimento de Vasco Gonçalves.
Ao nível editorial, vai ser lançada uma fotobiografia do ex-primeiro-ministro, da responsabilidade da família, e o livro “Quem foi Vasco Gonçalves”, editado pela associação e que inclui textos sobre o general do líder cubano Fidel Castro (1926-2016) e do ex-presidente da Venezuela Hugo Chavez (1954-2013).
Ainda na cidade de Lisboa, em Telheiras, segundo Manuel Begonha, vai ser colocada uma plana com o nome de Vasco Gonçalves num largo que tem o seu nome. Serão ainda editados um cartaz e uma medalha evocativa.
Da comissão de honra das comemorações, que e têm como lema “a moral e a política vão de par e não se podem dissociar”, fazem parte militares e civis que estiveram em lados diferentes das barricadas da Revolução do Cravos.
A lista é grande e inclui Dinis de Almeida, Duran Clemente ou Mário Tomé, mas também do lado do grupo dos nove, como Vasco Lourenço.
Há ainda um grupo de personalidades de outras áreas como o arquitecto Siza Vieira, o historiador António Borges Coelho, o arqueólogo Cláudio Torres, dirigentes políticos como Carlos Carvalhas e Jerónimo de Sousa, do PCP, Heloísa Apolónia (PEV), a atriz Maria do Céu Guerra, Manuela Cruzeiro e Pilar del Rio.
O antigo primeiro-ministro Vasco Gonçalves, que morreu em 2005 aos 83 anos, foi uma das figuras ligadas ao período revolucionário mais controverso e que mais paixões e ódios suscitou.
Foi chefe dos II, III, IV e V Governos Provisórios, entre 18 de julho de 1974 e 10 de setembro de 1975 e o seu nome era aclamado nas manifestações e comícios durante o PREC (Período Revolucionário em Curso) em ‘slogans’ como “força, força, companheiro Vasco, nós seremos a muralha de aço”.
O período em que chefiou o governo ficou conhecido por “gonçalvismo” e ficou marcado principalmente pelo combate aos monopólios e aos latifúndios.
A nacionalização da banca e dos seguros, a par da aceleração da Reforma Agrária, foram decisões emblemáticas do chamado “gonçalvismo”, ainda hoje sinónimo de extremismo de esquerda para as forças de direita.
Em entrevistas e conferências que deu desde 1976, ano em passou à reserva compulsiva, disse sempre que Portugal seria muito melhor se tivessem prevalecido as ideias socializantes que defendeu e considerou inseparáveis da democracia.
Oriundo da Arma de Engenharia, a oposição do general Vasco Gonçalves ao salazarismo é referenciada nos anos 50 e nos primórdios do “movimento dos capitães”, que haveria de culminar, a 25 de Abril de 1974, no derrube do regime do Estado Novo, tendo sido um dos poucos oficiais superiores a apoiar os mais jovens militares.
Não se considerou, no entanto, um homem vencido, manifestando sempre a vontade e a determinação de “continuar a lutar”.
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