Novo solo de André Murraças recorda perseguições do Estado Novo

Inserido na programação paralela da exposição temporária “Adeus Pátria e Família”, o novo espetáculo de teatro mistura o documental com o ficcional sobre os homossexuais que a ditadura foi castigando ao longo de décadas.

Desde as primeiras prisões, à evolução do poder e intensificação da carga policial, ou a possível resistência, o espetáculo “é uma tentativa de conhecer quem foram estes homens e mulheres com vidas escondidas ou duplas, alguns deles com profissões triviais, outros ligados às artes ou às lutas políticas”, assinala um texto do museu sobre o espetáculo.

Para além de relatos sobre anónimos baseados nos arquivos da Polícia Judiciária, o espetáculo destacará o poeta António Botto e o escândalo da “Literatura de Sodoma” – que vitimou ainda os escritores Judith Teixeira e Raul Leal -, o bailarino encarcerado Valentim de Barros, Júlio Fogaça, dirigente do PCP, ou o médico Egas Moniz que considerou a homossexualidade como doença e contribuiu assim para a criação do estigma e a sua validação como crime.

“Quem foram estes homens e como se construiu um poder repressor que culminou com o Estado Novo? Que histórias não conhecemos?”, são algumas questões lançadas no espetáculo que conta histórias através de objetos pessoais, cartas, desenhos, filmes caseiros.

André Murraças assina o texto, encenação e cenografia do espetáculo, e é o seu intérprete único em cena.

Este tipo de teatro, que cruza o cinema com o documental, o privado com o público, tem sido alvo da atenção do criador que, por exemplo, falou da perseguição dos nazis aos homossexuais no espetáculo “O Triângulo Cor-de-Rosa” ou em “Santos e Pecadores” e “Sex Zombie – a vida de Veronica Laque”.

Paralelamente a este trabalho a solo, André Murraças desenvolve um trabalho enquanto dramaturgo e encenador com projetos com outros atores, como foi o caso do recente “Cabaret Repórter X”, para o São Luiz Teatro Municipal, ou “A Confissão de Lúcio”, no Centro Cultural de Belém, partindo da obra homónima de Mário de Sá-Carneiro.

André Murraças costuma destacar personagens – reais ou ficcionadas – que tenham vidas marcadas pelo lado trágico, mas que ainda assim insistem em não se resignar.

“Pessoas com vidas banais que acabaram por ser postas de lado, porque alguém assim o decidiu. Foi no seguimento desse trabalho, e na continuação de uma pesquisa pessoal que André Murraças tem desenvolvido trabalho sobre personagens LGBT portuguesas. Também assinou o projeto Queerquivo (www.queerquivo.com), um arquivo em livro e ´online´.

Nesse sentido, surgiu a ideia de apresentar no Museu do Aljube – Resistência e Liberdade — onde centenas de homens foram presos — com o objetivo de “descobrir mais sobre os anos negros do Estado Novo em Portugal” e “dar a conhecer uma parte do terror vivido por muitos portugueses naquela altura” para “dizer os seus nomes e contar as suas histórias”, sublinha.

O espetáculo “Sombras Andantes” vai estar em cena a 23 e 30 de setembro, às 19h00, e a 24 de setembro e 1 de outubro às 16h00, com entrada livre mediante inscrição.

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